O Globo
BRASÍLIA – O ano legislativo sequer
terminou, e a bancada do PMDB no Senado já discute a herança dos espaços
políticos que na última década foram ocupados por indicados do senador
José Sarney (PMDB-AP). A lista de cargos é encabeçada pelo setor
elétrico, com o Ministério de Minas e Energia, suas ramificações e
diretorias da Eletrobras e subsidiárias. Mas a influência do
ex-presidente da República se estende por áreas as mais diversas, como
Saúde, com diretorias na Funasa no plano nacional e estadual; e
Transportes, com cargos em superintendências regionais.
Pela
capilaridade do universo de seu domínio, aliados de Sarney apostam que
suas digitais devem permanecer vivas por muito tempo na esfera pública.
Mas, apesar de rumores de que Sarney deseja indicar sua filha, a
governadora do MA, Roseana Sarney, para um ministério do governo Dilma
como forma de dar continuidade ao seu espólio na máquina federal,
caciques peemedebistas veem como remota a possibilidade de o clã se
manter no poder formalmente a partir do próximo ano.
Os motivos são vários. O primeiro, e
mais óbvio, é a aposentadoria de Sarney, que decidiu não disputar mais
eleições e, a partir de 2015, ficará sem mandato. O vice-presidente da
República, Michel Temer, fez gestos ao aliado em encontros recentes,
chamando Sarney a continuar participando das reuniões, almoços e
jantares da cúpula do partido, mas senadores do PMDB apostam que a
presença do ex-presidente será menos efetiva e mais “honorária”, e que
sua atuação deverá funcionar nos moldes de uma consultoria informal para
a legenda.
A segunda razão para o afastamento do
senador do poder nacional é a derrota nas urnas de todo o grupo ligado a
Sarney no Maranhão. No governo do estado, Lobão Filho (PMDB) perdeu a
disputa para o adversário Flávio Dino (PCdoB); na eleição para o Senado,
os sarneysistas também foram derrotados, com Gastão Vieira (PMDB)
perdendo a vaga para Roberto Rocha (PSB).
No plano federal, a queda de um dos
principais representantes dos interesses de Sarney no governo, o
ministro Edison Lobão (PMDB), de Minas e Energia, é dada como certa.
Lobão é um dos políticos citados na delação premiada do ex-diretor de
Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa como um dos políticos
envolvidos no esquema de corrupção na estatal. O ministro já sinalizou a
interlocutores que deverá deixar a cadeira e reassumir seu mandato no
Senado. O nome para substituí-lo não foi definido, e o PMDB teme que a
pasta não permaneça com o partido.
— Sem Lobão, Sarney perde muito da
influência no governo. Sarney vai continuar sendo ouvido no partido, mas
sabe que política tem hora para entrar e para sair. Vai escrever o
livro dele e cuidar da saúde — diz um peemedebista próximo a Sarney.
Lobão como principal representante?
Mesmo fora do ministério, a tendência é
que Edison Lobão siga sendo o principal representante dos interesses da
família Sarney em Brasília, a partir de 2015 no Senado. Existe a
expectativa de que, mesmo enfraquecido, ele dispute as indicações para
os cargos que pertenciam a afilhados do ex-presidente. Sua influência
dependerá do tamanho do estrago que poderá causar o conteúdo da delação
premiada sobre os escândalos na Petrobras, que pode chegar às mãos dos
parlamentares em breve.
Isso porque os herdeiros familiares de
Sarney, os filhos Roseana e o deputado Sarney Filho (PV-MA), podem não
ter condições de dar continuidade ao trabalho do pai na política. Sarney
Filho é visto pelos mais próximos como herdeiro de sangue, mas não de
projetos. E políticos que participaram do encontro da cúpula
peemedebista semana passada contam que Roseana — preparada por Sarney
para sucedê-lo politicamente —, depois de desistir de disputar qualquer
cargo nesta eleição, tem demonstrado pouca disposição para pleitear uma
vaga no governo Dilma.
— Todo sinal que Roseana dá é de que
quer ficar fora da política. Pode não ser algo definitivo, porque
política está no sangue — conta um cacique do PMDB.
Voto em Aécio
Integrantes do setor elétrico lembram
que Sarney foi sendo desidratado desde que Dilma Rousseff assumiu seu 1º
mandato. Feudos desde o início do governo Lula ocupados por indicados
do senador do Amapá, como a presidência da Eletrobras e a da
Eletronorte, foram aos poucos mudando de mãos desde que Dilma assumiu.
Mas cargos estratégicos pelo fluxo de verbas, como diretorias de
consórcios de usinas hidrelétricas como Belo Monte, devem permanecer com
aliados de Sarney, sob o pretexto de manter a continuidade de suas
obras.
Outro episódio mais recente que conta
contra a perpetuação da influência de Sarney no governo é o fato de ter
votado em Aécio Neves nestas eleições. O senador foi flagrado por uma
rede de TV de Macapá no momento em que digitava o número 45 na urna
eletrônica. Apesar de não confirmar a escolha, aliados contam que o
gesto deve contar negativamente nas pretensões de Sarney de manter sua
esfera de poder no governo Dilma.
— Ele votou no Aécio e vai querer continuar participando do governo? — brinca um peemedebista.