Flávio Dino |
O choque entre o potencial rico e a pobreza abundante é o triste retrato
do Maranhão de verdade. Quem está no topo do regime está desorientado
Em artigo nesta Folha, a governadora Roseana Sarney sustenta que o Maranhão é um Estado rico e que vai muito bem ("O Maranhão de verdade", 12/1).
De fato, o Maranhão tem muitas riquezas, mas isso não se reflete na
qualidade de vida de grande parte da população, como revelam os
indicadores sociais do nosso Estado.
Esse é o paradoxo maranhense que a crise na segurança pública sublinhou para todo o Brasil.
Temos um extenso território cortado por ferrovias e rodovias.
Diferentemente de outros Estados do Nordeste, há água abundante em rios e
lagos. Nosso litoral é o segundo maior do Brasil, propício à pesca em
grande escala.
O complexo portuário maranhense está localizado próximo aos principais
mercados consumidores do mundo, o que aumenta a sua competitividade. A
agricultura e a pecuária são intensamente exploradas em nossas terras.
Nosso potencial para o turismo é reconhecido por todos, por exemplo com a
beleza única dos Lençóis Maranhenses. Somos a terra de Gonçalves Dias,
Ferreira Gullar, Nauro Machado e Zeca Baleiro, do bumba meu boi e de
centenas de outros valiosos grupos culturais.
No entanto, o Maranhão frequenta assiduamente as piores posições em
todos os rankings de medição da qualidade de vida. Os maranhenses são
atendidos pelo menor número de médicos e de policiais por habitante do
país.
Entre 2009 e 2013, o Maranhão seguiu o caminho inverso do Brasil no
quesito educação. O número de analfabetos cresceu no Estado, passando de
19% dos maiores de 15 anos para 20,8% nessa faixa etária.
Essas contradições entre o potencial riquíssimo e a pobreza abundante é o
triste retrato do Maranhão de verdade. Após 50 anos de mando, os que
estão no topo desse regime estão desorientados e descolados da
realidade.
Nada mais revelador do que o governo do Estado comprar toneladas de
lagostas, camarões e caviar, complementadas por champanhes e uísques
importados, para o consumo dos altos escalões do poder enquanto bárbaras
cenas nos presídios maranhenses são veiculadas pelo mundo inteiro e as
famílias ainda choram por seus parentes.
É fundamental compreender que há direta conexão entre os problemas
sociais e a configuração da política maranhense. O patrimonialismo
praticado no Maranhão é o mais exacerbado da história brasileira.
Isso faz com que os recursos públicos sejam direcionados visando, acima
de tudo, à acumulação privada de bens, e essa é a causa principal para
que tantas riquezas não se traduzam em serviços públicos minimamente
razoáveis.
Essa terrível crise do sistema penitenciário mostra que é urgente virar
essa página em nosso Estado, assegurando a igualdade de todos perante a
lei, o primado dos direitos fundamentais e a honesta aplicação do
dinheiro público. Os valores da República precisam chegar ao Maranhão
para que o nosso povo seja rico de verdade. Essa é uma causa que
interessa a todo o Brasil.
FLÁVIO DINO, ex-deputado federal (PC do B-MA) e ex-juiz federal, é presidente da Embratur (Instituto Brasileiro de Turismo) Fonte Folha de São paulo
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